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MEMBRO DA REDE DE ASSSESSORES DO CEFEP FAZ ARTIGO SOBRE OS 2 ANOS DA ECONOMIA DE FRANCISCO, PROPOSTA PELO PAPA.

Estamos a 2 anos da convocação da Economia de Francisco feita pelo Papa Francisco. A convocação é para um evento-processo para o qual o Papa convoca jovens economistas, empreendedores empresariais e sociais do mundo todo. Foi apresentada no dia 01 de maio de 2019, dia do trabalhador/a, indicando a pensarem e articularem uma nova economia, pautada nos ensinamentos de São Francisco de Assis. Roberto Jeferson Normando, natural de Campina Grande-PB, atuante nas Pastorais Sociais, membro da coordenação colegiada da Escola Diocesana de Fé e Política de Campina Grande-PB, coordenador executivo do Observatório Social do Nordeste, membro da Rede de Assessores do CEFEP e um dos escolhidos para representar a delegação brasileira no evento, escreve um artigo para lembrar essa importante data.

Em sua reflexão, Roberto Jeferson faz um paralelo da proposta com as iniciativas gestadas na realidade histórica do Nordeste Brasileiro, falando da experiência do protagonismo social presente em várias fases da Igreja, citando como exemplo a iniciativa de Dom Helder Camara ao convocar o I ENCONTRO DOS BISPOS DO NORDESTE, em 1956, que contou inclusive com a participação do então Presidente da República, Juscelino Kubischeck e parte do seu ministério. O evento teve como fruto o compromisso assumido de implantar várias obras estruturantes apresentadas nesse encontro.

O artigo completo pode ser lido abaixo:

 

O Nordeste e a Economia de Francisco e Clara

 

“Acredito nessas minorias capazes de compreender a Ação, Justiça e Paz e de adotá-la como campo de estudo e de atuação. Chamo-as Minorias Abraâmicas porque, como Abraão, esperamos contra toda esperança”. Dom Helder Câmara

“Não acontecerá que um construa e outro more, tampouco um plantará e outro comerá; pois meu povo alcançará a idade das árvores, e meus eleitos consumirão o produto do seu trabalho” Isaías, 65:22.

O Papa Francisco, através da Carta de 01 de maio de 2019, dia do trabalhador/a, convocou um Encontro sobre Economia que deverá ser realizado na cidade de Assis, na Itália. Já no seu primeiro parágrafo se dirigindo aos jovens, economistas, empreendedores empresariais e sociais de até 35 anos, público alvo do encontro, já indica a missão de pensar e articular uma nova economia:  “(…)economia diferente, que faz viver e não mata, inclui e não exclui, humaniza e não desumaniza, cuida da criação e não a devasta. Um acontecimento que nos ajude a estar unidos, a conhecer-nos uns aos outros, e que nos leve a estabelecer um “pacto” para mudar a economia atual e atribuir uma alma à economia de amanhã.”

A cidade de Assis, foi escolhida para o construto de novas ideias sobre uma economia voltada para sustentar a força da vida por causa de São Francisco, o jovem que se fez pobre para viver a radicalidade do evangelho. O Papa Francisco na esperança da radicalidade do amor que refaz percursos e regenerar o pensar deu o nome do Encontro/Movimento Economia de Francisco.

O Encontro estava programado para os dias 26 a 28 de março de 2020,  foi adiado em função da pandemia, tendo acontecido no mês de novembro uma etapa online, direto de Assis e de várias partes do mundo, mas seu processo de construção e articulação não parou, pelo contrário com a ajuda dos espaços virtuais vem crescendo e ampliando os vários debates, textos, seminários virtuais e lives.

O adiamento da etapa presencial acabou ajudando a promover um amplo processo de construção do movimento por uma nova economia, este processo somado ao agravo da pandemia, nos mostrou o quanto o mundo é desigual e necessitado de uma virada humanista da solidariedade e da justiça social e ambiental.

O Encontro acontecerá com a participação de mais de 2.000 delegadas/os de todo o mundo. Do Brasil, são mais de 280 e eu tive a surpresa e graça de ser um dos selecionados para participar deste momento em Assis. Mais que um Encontro com o Papa Francisco, é um processo, um chamado a um movimento que desde as bases possa ensaiar iniciativas que promovam a economia da vida e não da morte, iniciativas desde das cooperativas de agricultores, de artesãos, dos catadores/as e tantas outras, a iniciativas de formação e formulação de propostas de política econômica comprometidas com o cuidado da criação e com a superação das desigualdades.

“Deus não nos fez bispos de almas desencarnadas” Dom Helder Câmara, durante o I Encontro dos Bispos do Nordeste em 1956.

O chamado do Papa Francisco, encontra aqui no Nordeste um protagonismo social da Igreja que não começou hoje. Arrisco a dizer que a mesma inspiração que faz o Papa Francisco convocar um Encontro, fez Dom Helder Câmara articular o I Encontro dos Bispos do Nordeste que teve como o objetivo refletir e propor saídas para o desenvolvimento e a justiça social no Nordeste, encontro acontecido em maio de 1956, na cidade de Campina Grande – PB, uma cidade média do semiárido nordestino. Daquele encontro participou o então Presidente da República Juscelino Kubitschek e parte do seu ministério, ao final o Presidente assinou vários decretos com obras estruturantes para os estados nordestinos e cria o Grupo de Trabalho pelo Desenvolvimento do Nordeste – GTDN que em seguida seria coordenado pelo paraibano e economista Celso Furtado. A Igreja do Nordeste saía do encontro com uma Agenda de promoção humana comprometida com a justiça social e com o diálogo com os governos nesta perspectiva. E em maio de 1959, dessa vez na capital do Rio Grande do Norte, Natal, aconteceria o II Encontro dos Bispos do Nordeste com a participação do então Presidente da República e do Coordenador do GTDN, Celso Furtado. Uma das razões do II Encontro era avaliar o caminho feito entre 1956 e 1959 e propor novas políticas para a região. Entre tantos frutos, o mais notável foi a Criação da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste – SUDENE, sucedendo o GTDN e assumindo as propostas destes encontros. Esta fase representou a opção pelo diálogo com os governos a favor dos pobres e da justiça social. Vale destacar nesta fase, a importante contribuição da Ação Católica, das Juventudes Agrária, Estudantil, Independente, Operária e Universitária Católicas, como também os movimentos de evangelização no meio rural, entre outros.

O Pontificado do Papa João XXIII e o próprio Concílio Vaticano II, chegavam no Nordeste e já encontravam uma Igreja em busca de renovação, o Concílio impulsionou ainda mais este movimento de renovação e compromisso social e ao mesmo tempo formou uma geração de bispos, padres, religiosas/os, leigos/as que fizeram dos seus ministérios um serviço de comunhão e participação.

Uma segunda fase de protagonismo social da Igreja Nordestina, foi a fase da resistência da ditadura militar, a luta pelos direitos humanos, pela democracia e da organização dos trabalhadores/as, a Igreja entendia que não bastava apenas dialogar com o poder público, mas era fundamental apostar na conscientização cidadã e na própria organização popular. Os pobres e trabalhadores/as sujeitos da sua história e partícipes das mudanças da sociedade. Destaque nesta fase para o Documento dos Bispos e Superiores Religiosos “Ouvi os Clamores do meu Povo/1973”, documento que denunciava as injustiças do nordeste e a ditadura e assumia a defesa dos direitos humanos. Outro destaque para as Comunidades Eclesiais de Base (CEB,s), estas foram o espaço da vivência de uma Igreja Povo de Deus e da inserção social como compromisso e sinal do Reino e missão batismal, da terra prometida, terra sem males. As comunidades se espalharam pelo chão do Nordeste como sementes de uma nova terra e um novo céu.

A terceira fase importante foi a luta e articulação a favor do semiárido. Num primeiro momento desenvolvendo um trabalho contra os efeitos das secas, mas aos poucos foi crescendo a consciência que não se combate seca e sim convive. O problema maior era a indústria da seca e as suas estruturas de concentração da água, da terra, da renda, foi aí que cresceu o movimento pela convivência com o semiárido. Nesta fase cresceu a pluralidade de organizações da sociedade civil, e as universidades ganharam um importante papel na região contribuindo para a expansão do campo da pesquisa, dos estudos sobre a região e novas propostas. É marcante o importante documento de número 31 da CNBB cujo o título era Nordeste: desafio à missão da Igreja no Brasil.

Uma outra fase se deu no surgimento e fortalecimento das Pastorais Sociais; pastorais específicas, as pastorais de juventude, PJ, PJMP, PJR que floresceram como respostas aos vários gritos sociais, possibilitando também iniciativas de economia solidária, projetos de geração de renda e outras iniciativas no campo da formação sociopolítica à luz da Fé e da Doutrina Social Igreja, as Semanas Sociais, as escolas de Fé e Política, a importante ação das Casas e Instituições de Promoção Humana e Assistencial. Só para citar alguns momentos e iniciativas do protagonismo social da Igreja no Nordeste.

Este protagonismo deve nos ajudar a responder com ousadia, criatividade e esperança ao chamado do Papa Francisco para trabalharmos por uma nova economia; chamado profético que nos faz desde o começo de seu pontificado e que ficou tão claro na sua encíclica Laudato Si, renovado ao proclamar o ano 2020 – 2021 como o Ano Laudato Si.

Um chamado para pensarmos o Nordeste e o semiárido de hoje, os atuais desafios e as possibilidades de uma economia com rosto nordestino, mas conectada ao Brasil e América Latina para superarmos as desigualdades. Em comunhão com a Articulação Brasileira da Economia de Francisco e Clara (ABEFC), queremos fomentar o regional Nordeste da Articulação e ao mesmo tempo aprofundar o diálogo no campo eclesial, com as várias instituições, e movimentos da sociedade civil. Para Celso Furtado, só se resolveria os problemas do Brasil resolvendo os problemas do Nordeste e, resolvendo-se os problemas do Nordeste, estaríamos resolvendo os problemas do Brasil.

Nordeste e a Economia de Francisco e Clara, uma economia que é feminina, que encontra nas mulheres a dura resistência e recriação da vida neste chão do semiárido e das cidades nordestinas marcadas com as desigualdades e exploração de todo tipo. Em Clara não perdemos o ponto de partida, o ponto da radicalidade evangélica da promoção da vida e da vida em abundância.

Que o exemplo de Dom Helder Câmara, Pe. Ibiapina, Pe. Cícero, Santa Dulce dos Pobres e Margarida Maria Alves e de tantas outras e outros, nos ajude a encontrar os caminhos a partir de nossa realidade, das nossas potencialidades e biodiversidade, a economia da vida, da justiça social e ambiental e com isso aprofundarmos a democracia e a solidariedade.

Caminhemos! Viva o Nordeste! Viva Francisco de Assis e de Canindé! Viva Clara de Assis e de Canindé!

 

Roberto Jefferson Normando
Formação em Filosofia
Inscrito no Encontro Economia de Francisco
Agente de Pastoral Social
Coordenação Colegiada da Escola Diocesana de Fé e Política Dom Manuel Pereira de Campina Grande – PB
Coordenador Executivo do Observatório Social do Nordeste – Obserne