Dom Reginaldo Andrietta, Bispo Diocesano de Jales
“As pessoas que espalham amor não têm tempo, nem disposição para jogar pedras”. Essas palavras
da Irmã Dulce, cujo processo de canonização está em curso, servem-nos de luz diante de muitos
ataques que alguns setores da Igreja católica, inclusive a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil
(CNBB), têm recebido, indevidamente, pelas redes sociais. Muitas pessoas, em lugar de serem
socialmente ativas em favor dos irmãos carentes e sofredores, ocupam seu tempo em buscar o cisco
nos olhos dos outros, sem enxergarem a madeira que têm em seus próprios olhos (cf. Mt 6,1-5).
Elas jogam pedras, em lugar de espalharem o amor.
As palavras sábias da Irmã Dulce, em consonância com a Campanha da Fraternidade da Igreja
Católica deste ano, sobre a “superação da violência”, advêm de seus gestos concretos de caridade,
testemunhados desde sua infância. Muito jovem, ainda, sendo professora, tornou-se membro de
uma congregação religiosa católica, em uma comunidade de Salvador, Bahia. Ali, como freira, com
22 anos de idade fundou a União Operária São Francisco, demonstrando desde sua juventude,
sensibilidade à realidade dos trabalhadores. Com essa consciência, dedicou-se ao longo de toda a
sua vida aos pobres, criando muitíssimas obras de caridade.
A Beata Dulce dos pobres, falecida no dia 13 de março de 1992, com 77 anos de idade, se tornou
uma das mais influentes ativistas humanitárias do século 20. Suas grandes obras de caridade são
referências no Brasil e no mundo. Falar da Irmã Dulce é falar do amor ao próximo, vivido e ensinado
por Jesus, e entendido assim pela Igreja, desde seus primórdios, como atesta o apóstolo João:
“aquele que não ama seu irmão, a quem vê, é incapaz de amar a Deus, a quem não vê“ (1 Jo 4,20).
O apóstolo Tiago é igualmente contundente ao dizer: “a fé sem obras é morta” (Tg 2,20).
A história da Igreja Católica sempre foi intensamente permeada de belíssimas obras de caridade,
que testemunham a compaixão de Cristo para com os sofredores. Apesar de ela ter cometido muitos
erros, próprios de instituições humanas, sobressai-lhe seu caráter divino, afinal ela é sinal e
instrumento do Reino de Deus, e se assim não for não corresponderá à missão que lhe foi confiada
por Jesus Cristo. O Reino de Deus, conforme diz o apóstolo Paulo, “é justiça, paz e alegria no Espírito
Santo” (Rm 14,17). Esses valores são fundamentais na missão da Igreja.
Por que então, até mesmo irmãos de fé criam desavenças, agravadas pela falta de respeito, ao
expressarem críticas? Críticas com relação a visões e práticas da Igreja podem ser benéficas se não
forem infundadas, maldosas e feitas de maneira indevida. Discordâncias são normais; conflitos, não.
Cristo derruba os muros da separação e gera paz (cf. Ef 2,14). Por isso, discordâncias devem ser
tratadas no diálogo, face a face, não no Facebook. Uma informação distorcida na internet a respeito,
por exemplo, de ações sociais da Igreja, pode ser ocasião para se destruir obras de Deus, tão
importantes quanto as obras da Irmã Dulce.
A acusação leviana feita em redes sociais à CNBB sobre o eventual direcionamento indevido de
alguns recursos do seu Fundo Nacional de Solidariedade, advindos do “Gesto Concreto da
Campanha da Fraternidade”, gerou confusões. A CNBB esclareceu os fatos, por meio de uma nota
oficial, dissipando dúvidas e agradecendo “a todos que, generosamente, com sua doação, tornam
possível a realização de inúmeros projetos na defesa e promoção da vida, em todas as suas
expressões, com uma particular atenção aos mais necessitados”. Participemos, portanto, desse
“Gesto Concreto de Fraternidade”, próprio da quaresma, com renovada confiança, continuando a
espalhar o amor de Cristo, muito mais ainda, sob “chuva de pedras”.
Jales, 28 de fevereiro de 2018.